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Mustang: esportivo atual encontra antepassado 'raiz'

Dirigimos duas safras do Mustang: uma de 1967, dos primórdios do modelo, e a atual Mach 1

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Geração atual evoluiu bastante, mas mantém algumas semelhanças com o antecessor da década de 1960
Geração atual evoluiu bastante, mas mantém algumas semelhanças com o antecessor da década de 1960 Foto: Geração atual evoluiu bastante, mas mantém algumas semelhanças com o antecessor da década de 1960

Dizem por aí que os clássicos nunca envelhecem. Porém, eles muitas vezes são reeditados e incorporam novas tendências. É exatamente isso que aconteceu com o Ford Mustang: o pony car tornou-se um hit imediatamente após o lançamento, em 1964. De lá para cá, passou por releituras e reinterpretações (nem todas bem-sucedidas, é verdade), até a versão Mach 1, a única atualmente à venda no Brasil.

Que o Mustang Mach 1 é um automóvel entusiasmante, não há dúvida alguma. O VRUM, inclusive, já havia constatado que não falta esportividade a ele durante uma avaliação. Mas será que o modelo honra as próprias tradições? Foi para responder a essa pergunta que a reportagem reuniu duas safras distantes do pony car: uma do ano de 1967, ainda da fase inicial de produção, e a atual.

Traços hereditários

Primeiramente, o que chama a atenção são as semelhanças visuais. O Mustang não tem design retrô, como o Fiat 500, por exemplo, nitidamente pensado para reviver as formas do projeto original. Porém, vários detalhes remetem ao modelo "raiz", como os círculos na grade frontal, os faróis com a face interna chanfrada, as lanternas divididas em três filetes verticais e até o formato do painel.

O ícone do Mustang, nome originário dos cavalos selvagens que habitavam os Estados Unidos, fica em posição de destaque na dianteira de ambos os modelos. Porém, ao contrário do cupê 1967, o Mach 1 não faz qualquer tipo de menção à Ford: não há um emblema sequer. Isso, porque a multinacional já trabalha para que Mustang se torne submarca, com uma linha de veículos premium, incluindo um SUV elétrico.    

A concepção mecânica também traz semelhanças. Desde a primeira geração até hoje, o Mustang tem motor dianteiro e tração traseira. E não é qualquer motor: ambos os exemplares têm unidades V8 sob o capô. O do Mustang 1967 é um 4.7 com 203cv de potência bruta; aqui, porém, o 5.0 Coyote do Mach 1, dotado de tecnologia atual, abre grande enorme vantagem, entregando 483cv de potência líquida.

Contrastes

Aliás, não é surpresa alguma que exista um verdadeiro abismo tecnológico entre as duas linhagens do Mustang. No antigo, o câmbio é manual de quatro velocidades, enquanto a suspensão traseira é por eixo rígido. Já o novo tem caixa automática de 10 marchas com borboletas para trocas sequenciais no volante e suspensão traseira independente do tipo multilink.

Isso, sem falar nos auxílios eletrônicos, essenciais em um veículo tão potente. Eles vão desde os freios ABS (com discos Brembo nas quatro rodas) até alerta de colisão, assistente autônomo de frenagem com detecção de pedestres, alerta pós-acidente e sistema de permanência em faixa com detecção de fadiga. Há ainda sete modos de condução: normal, esportivo, esportivo+, pista, drag, neve/molhado e my mode.

Ao volante de um Mustang antigo

Nada disso parece fazer falta, porém, quando se senta ao volante do Mustang 1967. Apesar dos mais de 50 anos de idade, ele é surpreendentemente amigável com o motorista: os pedais são macios, a direção com assistência hidráulica é leve e, em marcha-lenta, o som delicioso do motor V8 é discretamente ouvido a bordo. Apenas os engates do câmbio exigem alguma intimidade, principalmente em reduções.

O interior exibe soluções típicas dos carros da década de 1960, como os bancos individuais sem apoios laterais e o volante com diâmetro grande e aro fino para os padrões atuais. Central multimídia? Nem pensar: quem domina o painel são os instrumentos analógicos. Por outro lado, o Mustang 1967 se sai melhor que o atual quando o assunto é visibilidade, beneficiado pela ampla área envidraçada.

O contato com o clássico foi breve. Entretanto, mesmo sem atingir grandes velocidades, deu para perceber que o V8 tem bastante fôlego: o Mustang arranca rapidamente e ganha velocidade facilmente aos toques do acelerador. Elástico, o motor consegue proporcionar retomadas desde as baixas rotações. Se comparado aos carros de hoje o cupê ainda manda bem, imagine em relação aos modelos da época...

Desempenho do Mustang Mach 1 impressiona

O Mustang Mach 1, naturalmente, é bem mais contemporâneo. A começar pelo botão de partida com chave presencial. O painel traz instrumentos digitais configuráveis e, claro, uma tela multimídia de oito polegadas, associada a um sistema de áudio com 12 alto-falantes. Os bancos abraçam o motorista e o passageiro, mas o couro preto é discreto demais frente ao estofamento vermelho do cupê 1967.

A posição de dirigir do Mach 1 é mais baixa e esportiva em relação ao Mustang antigo. Ponto comum entre ambos é o espaço interno bom apenas para dois ocupantes. A direção, eletricamente assistida, é mais direta, e a suspensão, mais firme, embora o rodar seja até confortável para um bólido de alto desempenho. Porém, a menor altura em relação ao solo exige maior cuidado em quebra-molas.

O V8 5.0 borbulha alto no habitáculo, mesmo quando o escape está no modo silencioso: há também a opção Normal, acionada por uma válvula na tubulação da descarga, que o deixa ainda mais audível. Ao pisar fundo, o motorista sente a coluna grudando no banco, tamanha é a aceleração: segundo a Ford, o Mustang Mach 1 tem 56,7kgfm de torque e vai da imobilidade aos 100km/h em apenas 4,3s.

O câmbio automático faz trocas rapidíssimas e, ao mesmo tempo, suaves, sem exigir costumes ou macetes. Mas, apesar das citadas limitações, a experiência de guiar o Mustang 1967 foi mais intensa. Talvez seja por sair mais do lugar comum ou pela imersão no passado, mas dirigir um esportivo antigo, sem eletrônica e desprovido de tecnologia, torna a interação entre homem e máquina mais franca.

Entre gerações extremas de um clássico

Um Mustang Mach 1 zero-quilômetro custa R$566.300. Sites de vendas exibem exemplares da década de 1960 em perfeito estado com preços nesse mesmo patamar. Ambos tem encantos: o esportivo atual impressiona pelo desempenho e a dirigibilidade de maneira geral, inclusive em alta velocidade. Já o antigo, oferece charme, história e um comportamento também cativante, mas de outra maneira.

Vai do gosto do comprador mais endinheirado: ambos são divertidíssimos brinquedos para adultos. Este jornalista, que é entusiasta dos antigos, não hesitaria em escolher um Mustang dos primórdios: afinal, os clássicos nunca envelhecem, certo? Porém, nada há de errado com o Mach 1, muito pelo contrário: após o período de convivência, ele deixou bem claro que faz jus à tradição dos pony cars da década de 1960.

Antigo preservado

O reluzente Ford Mustang branco, ano 1967, que participou da reportagem é do advogado Léucio Leonardo. Ele o adquiriu há cerca de quatro anos, da família de um colecionador de Belo Horizonte (MG), que havia falecido. O cupê, então, estava nas mãos do antigo proprietário há décadas e já encontrava-se em perfeito estado de conservação: assim, após o negócio, só foi necessário fazer uma revisão mecânica.

Leonardo, que é colecionador e membro do Veteran Car Club de Minas Gerais, revela que tem preferência por modelos europeus, mas acabou seduzido pelo Mustang. Ele o utiliza de maneira eventual, geralmente para participar de eventos de antigomobilismo, mas já chegou a viajar com o clássico da década de 1960.