Quem tinha razão era o Sérgio Habib, presidente da Citroën à época do lançamento do flex, em 2003. Ele dizia que a novidade era como o pato: nada, anda e voa. Mas faz tudo muito malfeito...
Dirigi o novo VW Golf na Europa. Um hatch médio, com motor 1.4 de 140cv, que rodou mais de 15km/l de gasolina no trânsito urbano. Na estrada, quase um desaforo: mais de 20km/l. Dá até vergonha compará-lo com os nossos automóveis.
Uma análise do “pré-flex” e “pós-flex” revela que engatamos uma ré naquele ano, pois, desde então, em uma autêntica contramão da história, o consumo médio de nossos automóveis se manteve em vários casos, aumentou em outros, diminuiu em alguns poucos.
A tecnologia flex foi responsável por um estado letárgico da nossa engenharia, que come poeira do primeiro mundo e se perdeu na questão da eficiência térmica. Além do tombo, o coice: com os preços atuais do etanol, só vale a pena usá-lo em três ou quatro estados brasileiros. E mais: o motor ainda é “meio-flex”, pois depende da gasolina do tanquinho para funcionar nas manhãs mais frias. Outras alternativas ainda são muito caras.
Se tivessem desenvolvido motores para o etanol, ele seria uma excelente solução para o Brasil. Mas o motor flex é um quebra-galho, projetado para a gasolina e depois adaptado para o álcool. Por isso, sua reduzida eficiência com qualquer dos dois combustíveis. É o “pato do Habib”...
Motores mais modernos, de Primeiro Mundo, alcançaram patamares de rendimento jamais imaginados. Funcionam com turbo, injeção direta, comando variável e outras novidades que alavancaram o desempenho e reduziram consumo e emissões.
Tecnologia similar poderia ter sido desenvolvida para o etanol, não fosse o uso compulsório dos dois combustíveis. E por não ser viável economicamente investir centenas de milhões de dólares em um motor que praticamente só teria demanda no mercado brasileiro.
Mas por que o flex? Porque a falta de etanol nos postos (no fim de década de 1980) arruinou a imagem do Pro-Álcool e o mercado só voltou para o combustível de cana ao se lançar o automóvel que tem a gasolina como opção.
Atualmente, empurra-se para o brasileiro um automóvel que tem consumo igual ou superior ao de 10 ou 20 anos atrás. Se o motorista reclama, a fábrica alega que a culpa é do combustível adulterado. Verdadeira conversa para boi dormir.
O desastre do flex está tão enraizado e absorvido pelo mercado que o governo federal, engessado em suas análises, exigiu redução de 12% no consumo de nossos modelos até 2017, no recente plano de política industrial do setor. Um percentual pífio, que sequer compensa a marcha a ré engrenada nos últimos anos e longe de oferecer ao nosso mercado motores minimamente competitivos com os do Primeiro Mundo.