Legislação de segurança do trânsito só caminha em Brasília empurrada por lobistas e sob o tilintar de muito dindim. E, no caso de equipamentos veiculares, é muito dindim, pois são quase 30 milhões de veículos em circulação no país. Multiplique-os pelo preço de um estojinho de primeiros socorros, ou de um extintor de incêndio, ou de um par de airbags, para se ter uma ideia de quantos bilhões de reais estão em jogo. No caso da lei que tornou obrigatórias as bolsas infláveis, por exemplo, tem um filho de senador que faz consultoria para uma fábrica do equipamento. Mera coincidência...
Mas existem outros dois fortes rolos compressores capazes de aprovar (ou não...) projetos de lei que tramitam em Brasília. O primeiro é a perspectiva de conquistar eleitores. O segundo é a arrecadação de impostos.
No mês passado, por exemplo, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto que impediria o Detran de transferir a multa relativa a uma infração de trânsito para o novo proprietário, caso o carro fosse vendido. Seria a correção de uma absurda distorção (provocada pela incompetência dos orgãos públicos) em que a infração é atribuída não ao motorista, mas ao automóvel. O presidente Lula vetou o projeto, pois "contraria o interesse público". Bastante discutível a explicação do presidente, pois o que vem a ser interesse público? Deixar de punir o inocente ou assegurar o faturamento irregular de multas?
Mais recentemente, o presidente Lula novamente escorregou feio ao aprovar a lei que regulamenta o mototáxi e o motofrete. Ele foi objetivamente alertado por ninguém menos que seu ministro da Saúde sobre o perigo representado pela decisão. Foi informado de que morrem no trânsito brasileiro, em média, 19 motociclistas por dia. Além das centenas de feridos. E que a regulamentação da profissão iria aumentar consideravelmente esse volume, pois mais jovens iriam aderir à categoria. Além disso, em vez de morrer só o motoqueiro, morre também (ou se acidenta) o passageiro.
Essa lei foi duplamente "beneficiada", pois vem ao encontro do interesse dos fabricantes de motocicletas, dos sindicatos de motociclistas e ainda conquista a simpatia de milhões de eleitores.
Seja como for, o presidente Lula tinha pleno conhecimento das perigosas consequências de sancionar a lei. E, se o fez, foi por ter colocado na balança, de um lado, algumas dezenas a mais de mortos e feridos por dia e alguns milhões de reais de despesas hospitalares. Do outro, o volume de votos conquistados, pois circulam hoje no país mais de 8 milhões de motos. A maioria de motoboys.
Nas contas de Lula, o saldo é positivo.
Saldo positivo
De um lado da balança, mais acidentados e despesas hospitalares. Do outro, o peso de alguns milhões de votos