UAI

Astúcia lusitana

O Brasil se tornou a galinha dos ovos de ouro da TAP Portugal. Esse nicho estaria nas mãos da Varig e TAM se o governo brasileiro agisse como o português

Publicidade
Foto:

Voo de Lisboa a Belo Horizonte, inaugurado há três anos, mantém procura em alta

 

O ex-presidente Sarney gostava de fazer uma viagem anual a Portugal. Diziam que era viagem cultural. Em 1986, a Universidade de Coimbra lhe concedeu o título de doutor honoris causa. Honraria igual a esta, cuja cerimônia aconteceu na quarta-feira, quando a nossa presidente viajou a Portugal para assistir ao ato solene de entrega ao ex-presidente Lula e teve que antecipar o retorno devido ao falecimento do ex-vice-presidente José Alencar. A diferença é que a honraria só aconteceu depois que o senhor Lula deixou de ser presidente. Viagem tão significativa quanto aquela realizada pelo ex-deputado Antônio Paes de Andrade, apelidado de Rei de Mombaça, que foi à sua cidade inaugurar uma cacimba (depósito de água). O ex-presidente Sarney estava fora do país. Os petralhas estão dando uma demonstração de força, obrigando a primeira mulher a ocupar o cargo de presidente da República a se afastar de sua lide para uma viagem de retorno zero.

Naquele ano, a alta administração da TAP Air Portugal estava presente na recepção realizada na embaixada do Brasil em Lisboa.

Em conversa, era possível sentir a aflição daqueles diretores quanto ao estado econômico e financeiro da empresa que dirigiam.

Entre as grandes preocupações, destacava-se a relativa ao grupo de voo e a atuação do sindicato da categoria.

Embora tenha nascido com capital privado, a TAP era uma empresa estatal que foi transformada em sociedade anônima, em 1991, com capital majoritariamente público. Em 1994, com problemas financeiros graves, os dirigentes lançaram o seu Plano Estratégico e de Saneamento Econômico-Financeiro.

Algo que poderia ter sido feito no Brasil para salvar a Varig. O finado ex-vice-presidente José Alencar propôs uma estatização temporária para saneá-la e depois devolvê-la ao capital privado. Grandes interesses estavam em jogo e a nossa maior empresa de transporte aéreo foi divida em duas partes, com resultante nula. A ela caberia a exploração do nicho que a TAP Portugal está explorando, agora com nova razão social. Em 10 anos, o faturamento das operações da empresa portuguesa no Brasil saltou de 1 bilhão de euros para 2,5 bilhões. Desde 2001, a TAP é a empresa europeia com maior presença no Brasil.

Conhecedor dos problemas da infraestrutura aeroportuária nacional e da demanda reprimida fora do eixo Rio - São Paulo, o seu presidente, o engenheiro brasileiro Fernando Abs da Cruz Silva Pinto, descentralizou as operações de sua empresa em nosso território. Isso só foi possível graças à política de céus abertos, que vem dando os seus passos iniciais. Conseguiu aliar duas fortes variáveis: fugir do congestionamento no Aeroporto Internacional André Franco Montoro, em Guarulhos, São Paulo, e facilitar a viagem de passageiros de diferentes regiões.

A TAP está operando em nove cidades brasileiras, fazendo o seu hub (aeroporto de distribuição de passageiros) no Aeroporto Portela do Sacavem, em Lisboa. Dele os passageiros oriundos do Brasil são transportados para os diferentes destinos da Europa, por meio das empresas que integram a Star Alliance.

A empresa já opera em Belo Horizonte, Brasília, Campinas (SP), Fortaleza, Natal, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo. A partir de junho, a TAP inicia voos ligando as cidades de Porto Alegre a Lisboa.

São 75 voos por semana para o Brasil.

É tão inteligente a estratégia adotada pela empresa que uma cidade do interior de São Paulo é capaz de lotar um avião para a Europa.

O lucro da empresa não é grandioso, mas já opera no azul e começa a atrair investidores internacionais para alcançar a privatização plena.

Quem tem viajado nos seus confortáveis A-330 da Airbus tece elogios aos serviços e à aeronave. Elogios não tão fartos à empresa TAM, que passou a ser a nossa única transportadora internacional de longo curso.

É uma pena, pois a Varig tinha uma estrutura pronta para explorar esse nicho. A sua administração fracassada poderia ter sido substituída.

Se tivéssemos as duas empresas operando para a Europa, dentro dessa estratégia de descentralização dos aeroportos nacionais de partida, diferentes aeroportos europeus poderiam receber a nossa bandeira, com grande economia de divisas. Sem ter alguém de visão na área de transporte aéreo e acolhendo os interesses de amigos, o governo Lula transformou o Brasil na galinha dos ovos de ouro da TAP Portugal.