Dave Lee
O desenvolvimento de carros elétricos é a única saída para a indústria automobilística no futuro, na avaliação do presidente de uma das principais empresas do setor - o brasileiro Carlos Ghosn, que comanda a Renault-Nissan.
Em entrevista ao Serviço Mundial da BBC, Ghosn defendeu ainda a decisão de vários governos no mundo todo de ajudar as companhias automobilísticas durante a recente crise econômica global.
Ghosn é visto como o responsável pela recuperação das duas companhias desde que assumiu a presidência da Nissan, em 2000, e depois também a da Renault, em 2005. Para ele, o caminho, agora, é o investimento em veículos com emissão zero de poluentes. "Acho que as tendências que estamos vendo estão todas apontando na mesma direção", diz ele. "O petróleo é um desafio, tanto em questão de preço como de disponibilidade", explica.
Para Ghosn, as regras ambientais devem também se tornar cada vez mais duras em todo o mundo. "Acho que a nova geração é muito mais exigente a respeito do ambiente do que jamais imaginamos", diz. Ele afirma que sua empresa planeja fabricar cerca de 500 mil carros elétricos por ano a partir de 2011, num investimento estimado em mais de US$ 3 bilhões.
Mas ele se diz preparado para ter paciência sobre o retorno do investimento. "Os carros elétricos não vão tomar o mercado de assalto, mas vai ser uma melhoria gradual", avalia. De acordo com Ghosn, as vendas de carros elétricos devem representar 10% do mercado de automóveis até 2020. Ele espera que a Nissan e a Renault abocanhem uma grande parcela desse mercado. "Somos os únicos investindo tanto nessa área. Então seremos os únicos com carros no mercado", diz. "É uma decisão enorme. Podemos estar errados... mas não estamos", afirma.
Riscos
O grande investimento da Renault-Nissan representa um grande risco. Atualmente, um carro elétrico com carga máxima tem autonomia para trafegar por cerca de 160 quilômetros, com uma recarga que leva aproximadamente 20 minutos.
Os críticos acreditam que essas limitações devem afastar muitos compradores em potencial. Mas Ghosn argumenta que "80% das pessoas na Terra que dirigem um carro, dirigem por menos de 100 quilômetros por dia". "Não devemos esquecer que esta é uma tecnologia que está começando, que vai maturar, ficar melhor, e as opções vão crescer", afirma o executivo.
Outros combustíveis limpos alternativos também podem ser um risco para a estratégia da Renault-Nissan, mas Ghosn não considera os biocombustíveis como uma concorrência. "Os biocombustíveis são melhores do que a gasolina, mas estão longe de serem satisfatórios, ambientalmente, como os carros elétricos", diz.
Segundo ele, a única alternativa real é a de carros com células de combustível movidas a hidrogênio. Esse é "um conceito muito promissor", mas os custos ainda são muito altos. Ele confia que os carros elétricos deverão se mostrar os mais viáveis quando mais pesquisas e desenvolvimento forem feitos.
"Nós vamos provavelmente cortar os custos a um terço. Mesmo as linhas atuais de carros já são muito mais confiáveis do que antes. Há várias melhorias em termos de segurança, confiabilidade, custo e peso que já foram feitas, e ainda não terminaram", diz.
Apoio financeiro
Durante a entrevista à BBC, Ghosn defendeu de maneira determinada as ações de vários governos que decidiram apoiar financeiramente os fabricantes de automóveis durante a crise. "Se temos apoio, não acho que é porque todos os governos são fãs de carros. Acho que é porque eles são fãs de empregos", afirma. "Somos grandes empregadores, e ninguém quer ver uma grande quantidade de postos de trabalho desaparecer de seus países", justifica.
"Temos que ser muito realistas sobre isso. Tudo o que ajuda o emprego será bem visto pelos diferentes governos e terá apoio", diz Ghosn. Ele diz, porém, achar correto que nem todas as empresas tenham sido salvas, dizendo que em alguns casos as falências tinham como causa questões fundamentais de competitividade.
O executivo brasileiro acredita que a ajuda às empresas automobilísticas não contrariou as regras da Organização Mundial do Comércio. "O que aconteceu entre outubro de 2008 e março de 2009 foi realmente excepcional. Não acho que esse período seja representativo da vontade ou não dos governos de intervir ou não intervir na sua economia", afirma.
"Todo mundo entrou em pânico. Estas eram circunstâncias extraordinárias, e todo mundo estava disposto a ser capaz de salvar uma grande parcela das atividades (econômicas)", diz. Apesar disso, Ghosn admite que os governos têm um papel muito ativo, e muitas vezes competitivo, na determinação das ações das companhias automobilísticas.
"Quando vamos hoje à China e queremos escolher um lugar para instalar uma fábrica, há uma competição entre as províncias. Temos a mesma coisa na Índia", exemplifica.
"Isso não é algo ligado a um país - isso se deve ao fato de que uma companhia automobilística chegando e construindo uma fábrica pode mudar sua vida", argumenta. "Sempre somos questionados sobre o que nos ajuda a ser competitivos e o que é um obstáculo à nossa competitividade", diz. "Isso não significa que o governo vai agir para atender a tudo, mas acho que é muito importante que você possa dizer aos governos o que é bom ou ruim para nós. Eles precisam escutar isso", afirma.