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Caso Corolla - Aula de prevenção de acidentes

Especialista na área de simulação em situações de urgência e emergência, Maria do Carmo Barros Nelo foi a primeira a denunciar o risco do Toyota Corolla no Brasil. Estado de Minas reportou em primeira mão

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Maria do Carmo, primeira a reclamar do problema com os Corolla, da Toyota, retirou o tapete que a montadora afirma ser a causa do problema e o pôs no porta-malas

Comprar uma briga com a maior fabricante de veículos do mundo não é tarefa simples. A médica Maria do Carmo Barros de Melo sabe disso, mas tem consciência de que foi peça importante para vencer a primeira parte de uma intricada batalha, quando a Toyota anunciou no início da semana que fará o recall de cerca de 110 mil Corollas no Brasil. Com persistência, ela soube encontrar as pessoas certas e contribuiu para que os consumidores brasileiros fossem tratados da mesma forma que seus pares do Hemisfério Norte, já que só depois de muitos meses a multinacional japonesa que fabrica o sedã em Idaiatuba (SP) reconheceu o problema e, pela demora, está sendo investigada pelo Departamento de Proteção e Defesa ao Consumidor (DPDC) e pode ser multada em até R$ 3 milhões. Para entender esse caso, uma boa maneira é conhecer a saga da médica.

Maria do Carmo comprou um Corolla equipado com câmbio automático no fim de 2008 e, em 24 de setembro do ano passado, quando foi arrancar o veículo, após aguardar no semáforo da Rua André Cavalcanti, no Bairro Gutierrez, em Belo Horizonte, o acelerador disparou. "Pisei no pedal do freio, que não respondeu. Vi que a pista da esquerda estava vazia e entrei na Avenida do Contorno em alta velocidade. Tentei puxar o freio de mão (de estacionamento), mas o carro não parou. Só então tive a ideia de colocar no neutro (posição do câmbio automático) e o carro parou, mas o motor continuou em alta rotação. Então desliguei o carro, mas fiquei com medo de que viesse algum veículo. Eu o liguei novamente e ele voltou a funcionar normalmente", relata Maria do Carmo.

Depois do susto começou a luta de Maria do Carmo. Ela procurou a concessionária Toyota Kawaii imediatamente, que no final do mesmo dia informou que o motivo era o tapete, que havia pressionado o pedal do acelerador. Ela não concordou com a análise, pois diz que observou os pedais e não percebeu nenhuma interferência do item. Contestou o diagnóstico e também ligou para o Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) da fabricante registrando a reclamação. Meses depois, em 28 de janeiro, quando voltou das férias, Maria do Carmo viu o noticiário explicando que o recall da Toyota nos Estados Unidos não era apenas do tapete, mas também por um problema no pedal e que atingia outros países.

A preocupação dela aumentou e Maria do Carmo voltou a ligar para a concessionária, encaminhou cinco e-mails para o SAC, mas só obteve retorno após o Estado de Minas publicar uma matéria com sua história. Na sequência, ela ficou atenta ao jornal, que publicou outros três relatos semelhantes ao dela. A médica também recebeu uma ligação de Patrícia Correa, que se acidentou com o Corolla, chegando a ter perda total com o carro.

Preocupada com a gravidade e com a falta de ação da Toyota, ela decidiu buscar ajuda com o deputado estadual Délio Malheiros, presidente da Comissão de Defesa do Consumidor e de Defesa do Contribuinte.

Foram marcadas duas audiências e a Toyota foi convocada a comparecer em ambas. Na primeira a fábrica não mandou representante, pois alegou que estava fechando o balanço do primeiro trimestre. Se a Toyota não compareceu, o promotor Amauri Artimos da Matta, coordenador do Procon Estadual, foi e colheu o depoimento de Maria do Carmo, Patrícia Correa e também de João Paulo Sena, outro proprietário que passou por duas situações de acelerações repentinas com o Corolla.

"Enquanto estamos aqui conversando, a Toyota ganha tempo e vidas podem estar sendo perdidas", afirmou Maria do Carmo em depoimento na Assembléia Legislativa de MG



"Enquanto estamos aqui conversando, a Toyota ganha tempo e vidas podem estar sendo perdidas", disse Maria do Carmo na audiência. O alarme da médica não foi feito apenas de palavras de efeito. Ela tem a exata noção do que falou. Desde que passou pelo susto, em setembro do ano passado, sabe que o problema é grave e que principalmente pode provocar acidentes. Maria do Carmo é professora do curso de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e dá aula na área de simulações em urgência e emergência. ?Poderia me machucar e também levar dano para alguém que está na rua. Na ocasião, cheguei a pensar em jogar o carro no paredão de concreto para evitar um acidente?, lembra Maria do Carmo, explicando que a atitude poderia ser prudente caso a pista estivesse movimentada.

Depois de um mês, em 6 de abril, três diretores da Toyota compareceram a audiência da comissão da ALMG e assumiram a falha no carro pela primeira vez. Para isso, eles analisaram dois veículos, o de Maria do Carmo e o de João Paulo, e disseram que o problema da ?aceleração espontânea? foi provocado pelo tapete, que prendeu o pedal do acelerador. Ambos discordaram da avaliação da fábrica, que também não se comprometeu a corrigir o defeito passível de ocorrer em todos os modelos que não estivessem com os tapetes originais e também sem as travas de segurança que os prendem.

Aliás, dois dias depois da segunda audiência, distante 15 quarteirões da ALMG, a assistente social Noêmia Resende, grávida de nove meses, bateu um Corolla, e, segundo a análise inicial da concessionária, o problema foi a fixação do tapete. O caso de Noêmia foi o décimo primeiro publicado pelo Estado de Minas.

O promotor Amauri Artimos da Matta proibiu a venda do Corolla em Minas Gerais, alegando que o carro gera um risco desnecessário ao consumidor. Motivado pela ação do Procon mineiro o Grupo de Estudos Permanentes de Acidentes de Consumo (Gepac) se reuniu com a montadora e a intimou a fazer o recall, sob pena de ter as vendas suspensas em todo o país. Assim, a Toyota anunciou que convocará cerca de 110 mil proprietários do Corolla, do modelo fabricado a partir de abril de 2008.

Porém, Maria do Carmo não está satisfeita. Ela tem consciência que a Toyota enfrenta uma crise mundial com recall de quase 9 milhões de veículos. Nos Estados Unidos, epicentro da crise, a culpa inicialmente também foi atribuída ao tapete. Mas o defeito não foi sanado e um recall para o pedal do acelerador foi realizado. Mas relatos de aceleração espontânea em modelos com o pedal substituído voltaram a ocorrer. "Como consumidora e cidadã, considero que houve uma boa resposta do Ministério Público. Eu não acho que a culpa seja do tapete, mas é um grande passo. Eu tentei empurrar o tapete com o pé e com a mão, para ver se pressiona o acelerador, e não consegui. Mas, se a Toyota afirma que é esse o problema temos que eliminar esse problema", afirma Maria do Carmo, que crê em uma falha eletrônica como origem.

A agência espacial dos Estados Unidos, a Nasa, foi convocada pelo departamento que investiga a segurança do transporte no país, o NHTSA, para ajudar a encontrar uma solução. E é nesse estudo que Maria do Carmo crê que possa sair uma explicação para os problemas do Corolla brasileiro também. Enquanto isso, ela continua dirigindo o Corolla. Por precaução retirou o tapete do assoalho e colocou no porta-malas. ?Evito viajar com o carro, mas uso no dia a dia, pois aprendi como parar em uma situação de emergência?, afirma.

Linha do tempo

Setembro de 2009

Toyota convoca 3,8 milhões de veículos para substituir o tapete nos EUA

Maria do Carmo quase sofre um acidente em Belo Horizonte

21 de janeiro
Toyota convoca, nos EUA, 2,3 milhões de veículos atribuindo a culpa da aceleração espontânea ao pedal

29 de janeiro
Estado de Minas publica matéria com o relato de Maria do Carmo

30 de janeiro
Mais três casos são publicados pelo EM (João Paulo Sena, Daniela Lima e Niarlei Tavares)

Fevereiro, março e abril
EM publica relatos de 10 casos de casos de aceleração espontânea

9 de março
Primeira audiência na Assembleia Legislativa de MG

6 de abril
Toyota reconhece problema em audiência na ALMG

20 de abril
Procon impede as vendas do Corolla em Minas Gerais

23 de abril
Toyota concorda em fazer o recall no Brasil após ser ameaçada de ter as vendas impedidas