O ritmo de desconcentração de participação de mercado das quatro gigantes do setor automotivo (Fiat, General Motors, Volkswagen e Ford) acelerou forte com a crise de crédito no Brasil. O aperto no financiamento principalmente para consumidores com foco em carros populares diminuiu ainda mais a fatia do grupo. Em 2005, considerando os cinco primeiros meses de venda do ano, as quatro montadoras detinham 82,13% do mercado. A chegada de novas marcas têm reduzido a diferença ano a ano. Mas, no comparativo entre 2015 e 2014, o ritmo acentuou-se. Somadas as quatro hoje detém 58,92% das vendas, enquanto em igual período do ano anterior tinham 63,94%. O cenário pode ser explicado pela blindagem da crise de alguns modelos de categorias superiores. Isso porque o público-alvo não é tão afetado pela maior restrição ao crédito.
Entre os 50 modelos mais vendidos no país, apenas 11 tiveram alta nas vendas nos cinco primeiros meses do ano, segundo relatório mensal da Fenabrave (outros cinco não podem ser comparados por serem lançamentos). Dois dos modelos que tiveram aumento de venda são da Honda: City (22,33%) e Fit (52,53%). Ambos custam mais de R$ 50 mil. Segundo o gerente de vendas da concessionária Banzai Honda, Renato Amorim, os dois modelos estão imunes à crise. Explicação: o lançamento do HR-V. O novo modelo da montadora japonesa tem atraído dezenas de clientes diariamente às concessionárias da marca, segundo Amorim. “São 50, 60 clientes por dia. O cliente entra de olho em um e traz movimento para outros carros”, afirma o gerente de vendas.
Com o sucesso, em vez de paralisar a produção como outras empresas que estão com os pátios lotados, os funcionários da Honda tem feito hora-extra para suprir a demanda. Hoje a espera pelo HR-V varia de um a três meses dependendo do modelo. “Às vezes não consigo emplacar um HR-V, mas eles saem com um Fit ou City”, afirma Amorim. Um detalhe é que a procura mais forte tem sido por modelos mais completos, com maior número de acessórios. “Isso mostra a migração de clientes que antes não comprava Honda e agora tem essa possibilidade”, acrescenta o gerente.
Público
O economista da Tendências Consultoria especializado no setor automotivo, Rodrigo Baggi, afirma que modelos mais básicos têm perdido mercado devido à maior sensibilidade do público-alvo à crise de crédito. “O consumidor de SUVs e outros modelos têm menos problemas com liquidez. Eles têm menor restrição em relação ao crédito. Alguns segmentos são mais blindados à crise”, afirma Baggi.
A redução na concentração do mercado diminuiu consideravelmente a diferença entre a Ford, quarta colocada em vendas do ranking, e a quinta marca do setor automotivo. Em 2005, a Honda ocupava o lugar, com 8,6 pontos percentuais de diferença para a Ford. Neste ano, a diferença é de apenas 2,88 pontos percentuais entre a montadora norte-americana e a Hyundai, atual quinta colocada. E a margem só não é menor por causa do lançamento dos novos modelos do KA, que impulsionaram a participação da Ford em 2015.
A perda de participação no mercado das integrantes do chamado big four (quatro grandes) é uma tendência de alguns anos com a vinda de asiáticas e outras montadoras para o Brasil, segundo Baggi. Ele afirma que as marcas conseguem se posicionar com preços melhores a partir de fábricas mais eficientes. A desconcentração é acentuada este ano com o maior impacto da crise. Enquanto em anos anteriores a participação das quatro grandes caía apenas um ponto percentual no comparativo entre anos, ao se comparar 2015 com 2014 é visível uma aceleração da diminuição da diferença. A concentração diminuiu 5,02 pontos percentuais no período. “Quando a crise bate na porta das famílias é que essa redução da diferença se acentua”, comenta Baggi.
Estratégia
O consultor de vendas da concessionária Tai Motors, Origem Júnior, afirma que o crescimento da Hyundai no país pode ser explicado pela oferta de um carro com custo-benefício atrativo para o consumidor. O HB20, principal modelo da marca, é ofertado a partir de R$ 38,8 mil. “Com o mesmo valor a ser pago em um popular, você pode levar um modelo premium com mais itens de série”, diz ele. Até abril, o carro é o terceiro mais vendido do país, atrás apenas do Palio e do Onix. “A crise existe, mas não foi tão impactante para a gente”, afirma Júnior.
Redução impacta autopeça
São Paulo – A forte crise pela qual passa a indústria automotiva brasileira já afeta intensamente o segmento de autopeças no país. O faturamento líquido do setor acumula queda de 14,73% no primeiro quadrimestre de 2015 em comparação com igual período do ano passado, mostra pesquisa do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) com dados de 64 empresas associadas. Essa retração é reflexo principalmente da queda de 22,63% nas vendas de peças para as montadoras – responsáveis pela maior participação no faturamento total do setor –, como resultado do forte recuo da produção de veículos no período.
Nesse cenário, as vendas de peças para montadoras vêm diminuindo sua representatividade no faturamento geral. Em abril, eram responsáveis por 60,2%, quase oito pontos porcentuais a menos do que em maio do ano passado (67,9%). Com queda acumulada de 21,05% no primeiro quadrimestre, as vendas de autopeças intrassetoriais também reduziram sua participação no faturamento total para 2,9% em abril deste ano, ante 3,1% em maio de 2014. Na contramão, os segmentos de reposição e exportações de peças, únicos a apresentar dados positivos de vendas no período, aumentaram sua representatividade no faturamento total de 14,5%, em ambos os casos, para 16,9% e 20%, respectivamente.
Com queda nas vendas, o nível de emprego do setor de autopeças também é afetado. No primeiro quadrimestre, recuou 10,61% em relação a igual período de 2014. Só em abril, a queda foi de 11,72% em relação ao mesmo mês do ano passado, a maior retração desde abril 2013, último dado trazido pelo levantamento do Sindipeças. A pesquisa mostra que a evolução do emprego no setor vem caindo desde março de 2014. Antes disso, a última queda na comparação anual tinha sido registrada em abril de 2013, de apenas 0,01%. A pesquisa não divulga números exatos de trabalhadores que foram demitidos nesse período, apenas os porcentuais do nível de emprego.
Ociosidade De janeiro a abril deste ano, a produção industrial de autopeças acumula queda de 11,55%, ainda menor do que o recuo de 21,29% da produção de veículos, de acordo com dados da Pesquisa Industrial Mensal de Pessoa Física (PIM), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com a queda na produção, a capacidade ociosa das fábricas de autopeças aumentou 4,35 pontos porcentuais nos cinco primeiros meses deste ano, atingindo 33,1% em abril.