Um dos protagonistas na tentativa de se construir no Brasil uma indústria automotiva nacional nos deixou no último sábado (14), aos 86 anos. José Anísio Barbosa de Campos, ou simplesmente Anísio Campos, foi o designer automotivo por trás de verdadeiras peças de arte como o Puma GT, modelos despojados como o buggy Tropí, veículos de competição como os AC, estudos de desempenho e aerodinâmica como o Carcará e até veículos à frente do seu tempo, como o subcompacto Dacon 828.
Ele foi responsável pela criação de mais de 15 modelos entre 1960 e 1990, época em que os veículos fora de série faziam sucesso porque o mercado automotivo brasileiro estava fechado à importação, medida protecionista que beneficiava os fabricantes que aqui se instalaram (Ford, Volkswagen, Chevrolet e Fiat). Poucos sabem que Anísio Campos também fez parte de um respeitável time de pilotos brasileiros, com caras como Bird Clemente, que “fizeram miséria” ao volante dos DKW/Vemag, em uma época em que os fabricantes usavam as pistas para mostrar que seus carros eram os melhores. Confira alguns veículos que nasceram na prancheta do designer.
Puma GT
Sem sombra de dúvida, a mais bela carroceria assinada por Anísio Campos é o Puma GT, uma evolução do GT Malzoni, veículo nascido nas pistas e com poucas unidades de passeio fabricadas pela empresa Lumimari (de Rino Malzoni e outros sócios), que deu origem à Puma. O GT trazia carroceria de fibra sobre chassi DKW, assim como o motor de três cilindros com 981cm³ de cilindrada, 60cv de potência e tração dianteira. A absorção da DKW Vemag pela Volkswagen, em 1967, forçou a descontinuidade do GT, que teve 125 unidades produzidas.
Carcará
Foi o primeiro veículo desenvolvido para estabelecer uma marca sul-americana de velocidade, em 1966, desafio estabelecido pelo departamento de competição da DKW Vemag. Anísio foi o responsável pelas linhas aerodinâmicas do veículo de chassi tubular e motor central. O peso não chegava a 500 quilos e não se sabe o coeficiente de arrasto (cx) exato do Carcará. O motor DKW teve a capacidade volumétrica ampliada de 981cm³ para 1.089cm³, e desenvolvia potência de 105cv a 5.800rpm e torque de 11,6kgf a 5.000rpm. Detalhe interessante era que a DKW estava praticamente vendida para a Volkswagen, e o setor de competição já tinha data para ser encerrado. O teste foi realizado em um trecho da rodovia Rio-Santos (hoje Avenida das Américas, na Barra da Tijuca) e o veículo atingiu a velocidade de 212,9km/h.
Tropí
São várias as versões de buggies pelo mundo, e Anísio Campos fez a sua interpretação para o veículo praiano na década de 1970. O Tropí era fabricado pela Kadron (famosa pelo escapamento), então o modelo também é conhecido pelo nome da empresa. Com grandes faróis circulares mais centralizados e emoldurados pelo capô, o modelo é bastante carismático. Rodas largas e o escapamento exagerado davam ainda mais charme. O chassi encurtado e a mecânica era Volkswagen, enquanto a carroceria de fibra era produzida pela Puma. O bugue também era vendido como kit.
Puma GT 4R
A história desse modelo tem início a partir de uma promoção bem mais emocionante que a do filme A fantástica fábrica de chocolates. Porém, no lugar de um vale-brinde que dava direito a um passeio na fábrica, era o leitor da revista Quatro Rodas que participava de um sorteio cujo prêmio era simplesmente um modelo exclusivo fabricado pela Puma. O veículo foi produzido pela “dobradinha” Anísio Campos e Rino Malzoni, respectivamente responsáveis pelo projeto e execução. Em 1969 foram sorteados três ganhadores, mas sabe-se da existência de ao menos mais duas unidades produzidas fora da promoção, o que ainda torna o GT 4R um veículo bastante raro. As linhas misturam influências italianas e americanas. A carroceria era em fibra de vidro, montada sobre plataforma do Karmann-Ghia e com mecânica Volkswagen 1.600.
AC biposto
Carro de competição feito para ser construído em série. Suas linhas foram inspiradas nos veículos da categoria Can-Am. Construído em 1968, o biposto tinha estrutura tubular e carroceria de plástico reforçado com fibra de vidro. O AC foi apresentado durante o VI Salão do Automóvel no estande da Puma, que produziu os cinco exemplares.
Dacon 828
O subcompacto foi projetado em 1982 para a Dacon. Com apenas dois lugares, o veículo tinha 2,65 metros de comprimento. A carroceria em fibra de vidro usava chassi Volkswagen encurtado em 78 centímetros. As rodas eram de 10 polegadas, mas a maioria dos componentes eram VW, a começar pelo motor traseiro. O modelo foi construído até 1985, totalizando 48 unidades.
Topazzio
Outro projeto interessante foi o Topazzio, feito em 1988 para a Engerauto. Construído em fibra sobre uma Ford Pampa, eram três veículos em um, tranformação feita pela simples troca de componentes: picape de cabine dupla, três-volumes (a partir da colocação de uma tampa plana sobre a caçamba) ou um fastback (também com uma espécie de tampa que trazia um vidro traseiro bastante envolvente).