O governo brasileiro decidiu elevar dos atuais 35% para 50% a tarifa de importação dos carros vindos dos Estados Unidos. A medida faz parte do pacote de retaliações contra o país por não ter cumprido as determinações da Organização Mundial de Comércio (OMC) e retirado os subsídios aos produtores de algodão, após um processo legal vencido pelo Brasil.
A lista de produtos foi reduzida de 220 produtos para pouco mais de 100. Saíram produtos importantes para a indústria, como algumas máquinas, várias autopeças e partes e peças de aviões. Está decidido que os produtos do algodão, como fios, fibras, tecidos e confecções, que estavam na relação preliminar, serão mantidos. Os produtos de algodão representaram US$ 102,8 milhões em importações dos EUA em 2008. Como o valor autorizado pela OMC para retaliação na área de bens é de US$ 560 milhões, outros itens de bens de consumo e insumos foram incluídos, como alimentos, minerais, químicos, papel, veículos e cosméticos.
A sobretaxa aplicada pode chegar a 100%. Nos automóveis, será de 15 pontos porcentuais, de 35% para 50%. O Brasil comprou 2.141 veículos dos EUA em 2009, o equivalente a apenas 0,4% da importação total de veículos no período. Os principais fornecedores são Argentina e México.
Fabricantes prejudicados
Os modelos foram trazidos por BMW, Chrysler e Mercedes-Benz. No país da América do Norte, a BMW produz o utilitário esportivo X5 e o crossover X6. A marca da estrela de três pontas traz de lá o SUV médio-grande ML e o grandalhão GL, sob encomenda. Para os importadores independentes, que, ao todo, venderam 43,3 mil veículos em 2009, a fatia dos modelos americanos é relevante. "O prejuízo será maior para nós do que para o exportador", reclama o presidente da Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos (Abeiva), Jörg Henning Dornbusch, que também preside a BMW.
Segundo ele, modelos vindos dos EUA correspondem a 15% das vendas da BMW e a importação de alguns modelos pode se tornar inviável com o aumento da alíquota. Cálculos do mercado indicam que o impacto da alta de 15% da tarifa será de cerca de 10% a 12% no preço final. Para um modelo que custa R$ 300 mil, por exemplo, o aumento seria de até R$ 36 mil.
Entre as montadoras, a maior prejudicada será a General Motors. Pela primeira vez, a marca anunciou que vai importar o Camaro, cupê de luxo fabricado nos EUA, e o sedã Malibu, modelos na faixa de preço dos R$ 100 mil.
Jaime Ardila, presidente da GM do Brasil, reclamou da medida. "Se a taxa (alíquota de importação) aumentar, teremos de abandonar os estudos para trazer qualquer veículo dos EUA". Procurada hoje, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), que pediu para o governo a retirada dos carros da retaliação, disse desconhecer detalhes da lista que será divulgada na segunda-feira.
A lista está pronta desde 26 de fevereiro, mas a divulgação foi adiada para não atrapalhar a visita da secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, que esteve no Brasil na quarta-feira. "Por um acordo com o Ministério das Relações Exteriores, adiamos a publicação para não causar nenhum tipo de constrangimento à secretária Hillary Clinton", disse hoje o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge.
Fase de negociações
Washington enviará a Brasília uma delegação para negociar compensações comerciais. Devem integrar a missão o vice-conselheiro de Segurança Nacional, Mike Fromane, e o secretário de Comércio, Gary Locke. Um pacote de compensações sugerido pelo setor privado inclui um fundo de apoio aos produtores de algodão, o compromisso da administração Obama em se empenhar pelo fim da tarifa do etanol, e agilizar as negociações para liberar a entrada da carne brasileira nos EUA.
O valor total da retaliação autorizada pela OMC é de US$ 830 milhões. Mas a lista de bens deve atingir US$ 560 milhões. Nos US$ 280 milhões restantes, o Brasil optaria pela quebra de patentes para remédios, filmes e outros produtos. O governo brasileiro deve concluir este mês essa segunda lista.
O assunto provoca forte oposição do setor farmacêutico. "Quebrar patentes cria um ambiente negativo num momento muito bom para a inovação ", disse João Sanches, diretor de Assuntos Corporativos da Merck Sharp & Dohme (MSD).
"Continuamos tentando evitar a retaliação, pensando em uma maneira de não quebrar a relação entre os dois países", disse ontem o embaixador dos EUA no Brasil, Thomas Shannon. Ele reforçou que "não faz ameaças". No início do ano, havia dito que "a retaliação sempre provoca uma contrarretaliação".