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Internet é território livre para encontro de quem disputa rachas e pegas

Como se fosse algo positivo, imagens de carros que chegam a passar os 300 km/h em vias públicas, são publicadas pelos próprios infratores em sites na internet. Divisão de inteligência da polícia já monitora grupos para eventuais operações

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Foto:

As imagens de câmeras na Avenida Nossa Senhora do Carmo, em BH, registram dois flashes passando. As luzes eram de um Honda Civic e de um Land Rover Discovery que, nitidamente, disputavam um racha. O Land Rover acertou o Ford Focus e matou um jovem de 20 anos, que cruzava a via. Na época, a perícia indicou que o motorista do SUV, um rapaz de 22 anos, dirigia a 140 km/h, acima do dobro da velocidade máxima permitida na avenida.

 

Veja o momento da batida: 

 

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O caso de repercussão nacional levantou a questão da disputa de pegas e rachas em ruas, avenidas e estradas. Essa infração ainda é muito comum em todo o Brasil e as disputas são marcadas e até mesmo divulgadas na internet sem o menor pudor. As imagens, muitas vezes feitas pelos próprios motoristas, são postadas na rede como troféus. O falso motivo de orgulho alimenta a fama dos corredores amadores, que colocam vidas em risco nas vias públicas todos os dias.


Comunidades em redes sociais e fóruns na internet, quase sempre dedicados a carros preparados e modelos esportivos, são o ponto de encontro deles na web. É no ambiente virtual que as imagens são divulgadas e comentadas por quem acompanha o universo automotivo.


Um vídeo no Youtube mostra um Chevrolet Captiva a 180 km/h na rodovia dos Bandeirantes, em São Paulo, tentando acompanhar um Lamborghini Gallardo. Dentro do carro, há uma mulher, que chega a criticar o comportamento do motorista e uma criança, que parece estar animada com a situação. Nos comentários do vídeo, o autor confirma que estava dirigindo e filmando ao mesmo tempo. “Sim, eu dirigia, filmava e ainda dava seta e trocava de pista. Só alguns fazem isso...”, comentou o autor do vídeo. Assista:

 

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Na mesma rodovia, em meio vários veículos, um BMW M3 chega aos 325 km/h. Tudo foi registrado por uma câmera instalada no interior do veículo. O mesmo autor tem vários vídeos mostrando suas irresponsabilidades no trânsito. Dos mais de 60 comentários, poucos chamavam a atenção para a infração.

 

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Muitos motoristas fazem da Rodovia dos Bandeirantes uma pista particular para acelerar sem limites. O bom estado de conservação da via é um convite aos infratores. Não precisa ter um carrão para querer se aventurar no asfalto e muitos se arriscam em carros velhos. Um dos vídeos de racha mostra um Gol 1984 preparado com turbo, apostando corrida com uma Ferrari 458 Italia e um Porsche 911. O grupo corta vários caminhões, ônibus e outros veículos na movimentada estrada. Os comentários revelam elogios ao vídeo e ao desempenho do veículo.

 

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Há os que desrespeitam as leis em duas rodas. Motos com desempenho superesportivos já são acompanhadas pelas autoridades. Várias já foram apreendidas em operações 'surpresas' da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Os trechos mais procurados pelos motociclistas são a BR-459, no Sul de Minas, a Rodovia dos Bandeirantes, no interior de São Paulo e a BR-060, entre Goiânia e Brasília.

 

O Vídeo abaixo mostra uma motocicleta chegando aos 299 km/h

 

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Os grupos se organizam em postos ou pedágios e saem em comboio. Não são raras situações em que eles chegam aos 300 km/h. Na última operação no Sul de Minas, a PRF apreendeu 19 motocicletas superesportivas que participavam de pegas em via pública. A polícia usa helicópteros, viaturas e homens descaracterizados que dão os flagras e comunicam aos policiais estrategicamente posicionados ao longo do caminho percorrido pelos motociclistas. Quando o grupo se aproxima da barreira, todos são parados e é feito o flagrante.


De acordo com o chefe de comunicação da Polícia Rodoviária Federal de Minas Gerais, Inspetor Aristides Júnior, não existem dados estatísticos sobre a realização de rachas e pegas. No entanto, os grupos são monitorados. “Fazemos um trabalho de inteligência e depois realizamos as blitzes como forma de coibir a prática”, explicou.


No Facebook, grupos fechados se manifestam a favor de competições amadoras em vias públicas. Uma postagem em um dos grupos revela o orgulho de um homem ao mostrar fotos de um racha que ele disputou com um BMW X6. O motorista trata a ação como uma 'brincadeira na Dutra'. Na postagem, ele diz que chegou aos 230 km/h e por duas vezes quase bateu seu carro no BMW. Nenhum dos mais de 80 comentários repudia o racha na rodovia mais movimentada do Brasil, que liga São Paulo ao Rio de Janeiro.

Homem posta imagem de tentativa de ultrapassagem durante um racha na Via Dutra



Falta de civilidade

Essas ações irresponsáveis postadas na internet não traduzem apenas a real situação do trânsito no Brasil, mas da sensação de superioridade do ser humano. O antropólogo Roberto DaMatta, que tem títulos publicados sobre a relação do homem com o trânsito e com os carros, culpa a falta de educação e respeito entre os motoristas em uma sociedade democrática. “O brasileiro, em geral, dirige de forma agressiva. Nós temos uma impaciência em ficar ao lado daquele sujeito que, para a gente, é um atrapalhador porque dirige devagar demais. O motorista não aceita seguir uma fila, quer sempre estar na frente do outro”, diz o antropólogo. 

Para o antropólogo Roberto DaMatta, os motoristas têm alergia a situações igualitárias


As pessoas que praticam esses atos ilícitos parecem não estar satisfeitas com seu papel na sociedade e não aceitam conviver com a legalidade. “O sistema de trânsito é constituído a partir da premissa que o carro nos coloca em situação de igualdade, mas a rua já virou um espaço de selvageria e o racha é o uso inadequado do espaço público. O cidadão tem que se convencer que cidadania e respeito às regras não são sinônimos de ser otário”, completa o antropólogo.


Penalidades

O racha configura infração gravíssima. O motorista perde sete pontos na CNH, é multado em R$ 574, tem a carteira de habilitação recolhida e o carro é apreendido imediatamente. O motorista ainda responde um processo por crime de trânsito.


DaMatta diz que as punições não fazem muito efeito no Brasil. “Aqui, punições só funcionariam se não houvesse o famoso 'você sabe com quem está falando?' ou 'sou filho de fulano'. Todos querem levar vantagem em alguma coisa”, explica.

 

Em 2012, uma operação da PRF acabou com os pegas na Fernão Dias.

 

O vídeo abaixo mostra como tudo acontecia:

 

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