Modelos com motor 1.0 ou 1.4 estão longe de ser empolgantes, certo? Não se eles trouxerem a tecnologia turbo em seu projeto. Duvida? Procure dar uma volta em um Volkswagen up! TSI com motor três cilindros 1.0 turbo, ou em um Fiat Punto T-Jet com propulsor 1.4 turbo. São motores que podem oferecer o melhor de dois mundos, pois proporcionam baixo consumo de combustível, quando usados racionalmente, mas também são capazes de mostrar bom desempenho se a situação o exigir.
O funcionamento do turbo é muito simples. Enquanto o gás expelido pelo escapamento (que seria desperdiçado) gira uma turbina, este mesmo movimento faz um compressor de ar entrar em funcionamento. O compressor faz a admissão do ar, comprime e envia para os cilindros. Isso permite uma maior quantidade de ar e combustível dentro dos cilindros, resultando em mais potência.
A primeira vez que a tecnologia turbo foi introduzida em um veículo de passeio (produzido em grande escala) foi em um Chevrolet Corvair, no início da década de 1960. De acordo com o engenheiro mecânico Celso Samea, membro da Comissão Técnica de Motores Ciclo Otto da SAE Brasil, as soluções técnicas naquele momento ainda não eram suficientemente boas, mas serviram para mostrar que a ideia era boa. O turbo voltou a ser usado novamente no começo da década de 1970 pela BMW e pela Porsche, na época com inovações que tornaram a tecnologia bem mais confiável.
MUDANÇA DE FOCO “Nesse período, o turbo mostrou que era viável, tanto que outros fabricantes aderiram à tecnologia. Foi quando ocorreu um incremento dos modelos turbo a diesel na Europa. O turbo mostrou que era uma alternativa para se obter mais performance a partir de um motor já existente”, analisa Celso. Vale ressaltar que, até então, a introdução do turbo visava apenas à melhoria do desempenho, já que o debate sobre redução de consumo e emissões ainda não estava na ordem do dia. Mas, com o passar do tempo, por diversos fatores, as discussões sobre consumo e emissões se tornaram importantes. Foi quando o turbo se mostrou uma solução eficiente, à medida que permite que um motor menor proporcione desempenho semelhante ao de um propulsor grande e beberrão, mas com menos consumo. É o conceito de downsizing ou rightsizing.
POR DENTRO Mas até chegar aqui, a tecnologia turbo precisou ser aprimorada. Quando você acelera um carro com motor aspirado, a reação é quase imediata, certo? Pois, um dos problemas do turbo era justamente o retardo dessa resposta, chamado de lag. O engenheiro mecânico explica que isso ocorre porque quando o motor está em baixas rotações, não existe um grande volume de gás de escape para acelerar a turbina, que vai fazer o motor reagir. Celso conta que, para otimizar o turbo nessa condição é necessário reduzir a inércia da turbina, o que foi feito com a adoção de materiais que oferecem menor resistência ao movimento e o uso de óleo nos mancais que sustentam o eixo que liga a turbina ao compressor, com baixas perdas por atrito. Quanto menor essa resistência, melhor é a resposta do turbo.
Outra característica importante é a aerodinâmica básica da turbina e do compressor. “Quanto melhor o entendimento do fabricante de como o gás vai se comportar, mais eficiente será a interação entre o gás e as pás do rotor”, disse o engenheiro, explicando ainda que, com isso, é possível conseguir pás menores e uma peça mais leve, reduzindo a inercia e resultando em um componente menor, mais fácil de ser acomodado no cofre do motor.
Um componente que tem papel primordial na boa experiência do motorista com o turbo é a válvula wastegate, que permite o ajuste do turbo às altas e baixas rotações. Sem essa válvula, você teria duas situações indesejáveis: se optasse por uma turbina muito pequena, esta reagiria rapidamente em baixas rotações, mas produziria um turbo pequeno demais. Já se optasse por uma turbina maior, seria daquele tipo que só responde bem em alta rotação. Essa válvula impede que todo o gás de escape chegue até a turbina, resultando em uma pressão uniforme, aumentando o torque máximo e o trazendo para rotações mais baixas.
Existem mecanismos mais sofisticados e caros, que podem fazer o turbo ser eficiente em altas e baixas rotações. No turbo de geometria variável, a turbina ganha pás móveis, que podem fechar ou abrir, reduzindo ou aumentando sua área de contato com o gás conforme a necessidade. Outra alternativa é o turbo de duplo estágio (ou biturbo), com um deles ajustado para rotações mais baixas e o outro para rotações mais altas. Com resultados de desempenho e consumo cada vez melhores, os motores turboalimentados tornaram-se uma realidade e já são usados por quase todos os fabricantes de veículos e em todo o mundo, em escala cada vez maior.
NO BRASIL O uso do turbo em motores no Brasil não é novidade. O primeiro modelo nacional produzido em série a usar essa tecnologia foi o Uno Turbo, lançado pela Fiat em 1994, equipado com motor 1.4 de 118cv. Depois a montadora apresentou o Tempra Turbo 2.0, em 1995, e o Marea 2.0 Turbo, em 1998. A Volkswagen também investiu nessa tecnologia e no final da década de 1990 produziu no Brasil o Golf com motor 1.8 Turbo de 150cv, o mesmo que equipava o Audi A3. Em 2002, o mesmo motor teve a potência elevada para 180cv. A Volkswagen lançou, posteriormente, o primeiro 1.0 com turbo, que foi usado no Gol e na Parati, mas que apresentou tantos problemas que foi retirado de linha. A montadora corrigiu o erro, recentemente, ao lançar o up! com motor três cilindros 1.0 TSI, com desempenho e economia de combustível impressionantes. A Hyundai seguiu o mesmo caminho, lançando o HB20 1.0 Turbo, e a Ford e a Honda também vão apresentar em breve modelos com motores compactos turboalimentados. Só falta a Fiat apresentar o seu três-cilindros turbo, que era esperado no Mobi, mas vai demorar um pouco mais para chegar ao mercado.