Prioridade para circulação dos automóveis nas cidades é a regra no Brasil. Todos estão cansados de ouvir. Será mesmo que existe esse “privilégio”? Por causa de arrecadação de impostos, a lógica econômica diz que quem paga a conta deve (ou deveria) usufruir, se não os melhores serviços, pelo menos algo proporcional ao desembolso.
Fique de lado toda a imensa cadeia de impostos, taxas, tarifas e penduricalhos fiscais e parafiscais, em níveis federal, estadual e municipal, que incide sobre os motoristas ao longo de toda a vida de suas máquinas. De longe, a maior carga fiscal do mundo, direta e indireta. Foco é no IPVA. O Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (inclui barcos e aviões, mas quase tudo vem de veículos sobre pneus), apenas em 2012, arrecadou nada menos de R$ 27 bilhões (cerca de US$ 14 bilhões), segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário. US$ 14 bilhões, só como ordem de grandeza, foi o custo histórico da hidrelétrica de Itaipu, ainda hoje a maior do mundo em geração efetiva, que levou sete anos em construção.
Metade de apenas esse único volumoso imposto vai para Estados e a outra metade é dividida entre municípios. Então, prioridade mínima para a circulação de veículos deveria incluir coisas corriqueiras como manutenção das vias e, mais do que isso, a sinalização semafórica. Seria absurdo, então, pedir câmeras de vigilância (em funcionamento efetivo) e painéis eletrônicos que indicassem situações de emergência, mais do que previsíveis em cidades do porte de São Paulo? A resposta, provavelmente, é que se trata de privilégios.
Volte-se ao corriqueiro, então. Chuvas fortes de verão, inundações de praxe, queda de árvores, falta de luz e o trânsito, obviamente, caótico. Mas como reagir, horas depois de um temporal, já com iluminação pública recuperada, a mais de uma centena de semáforos apagados ou embandeirados? Revoltante uma viagem de 20 minutos se transformar em duas horas porque a cidade mais rica e que mais arrecada impostos tem apenas 200 cruzamentos com no-breaks, que em caso de apagão mantêm equipamentos elétricos e eletrônicos em funcionamento.
Não é vantagem indevida nenhuma. Tanto que a prefeitura paulistana e a concessionária de energia assinaram convênio para outros 178 sinais com no-breaks. Mas não foram instalados e se desentendem sobre a data em que deveriam ter sido. Mais grave: quem garante que a manutenção preventiva foi ou será feita? Metade das câmeras de vigilância de trânsito está inoperante por falta de cuidados. Mas os radares, fontes de arrecadação, estão perfeitos e com no-breaks, na maioria.
Plano de semáforos inteligentes, que se autoajustam ao nível do tráfego, foi desdenhado e sua ampliação nunca efetuada. Certamente faz parte de regalias, daquelas que merecem condenação veemente. Mais fácil é impor rodízio de circulação pelo final da placa, que cria outros problemas e adia soluções inteligentes.
Indústria automobilística gera impostos suficientes para ampliar o transporte sobre trilhos (subterrâneo e aéreo) e melhorar, realmente, o trânsito nas grandes cidades. Motorista e automóvel não podem ser culpados pela inépcia do poder público. Ou, para sempre, pagar e ficar calado.