Um bilhete de loteria premiado e o destino escolhido pelo pai para o dinheiro – a compra de uma linha de ônibus no Bairro Caiçara – levaram Alexandre Cortes a viver entre caminhões e coletivos. Filho de um ex-cobrador, que depois progrediria, o empresário de 44 anos brinca ao dizer que praticamente nasceu dentro do lotação (como eram conhecidos os ônibus urbanos na década de 1960) da família. Sem condições de manter um carro, o patriarca João Batista Cortes não pensou duas vezes antes assumir o pesado volante para levar a mulher, sentido as dores do parto do filho, até o hospital. O primeiro ônibus deu origem ao Expresso Tereza Cristina, tradicional empresa que interligou Belo Horizonte aos vales do Aço e Jequitinhonha até 1998 (quando foi vendido para a Saritur), mas a saudade ficou na mente de Alexandre. A admiração pelo esforço do pai, já falecido, e a empresa, onde cuidou da área de manutenção, foram determinantes para o empresário investir na reforma de um ônibus Ciferal ano 1974.
Garimpado numa revenda de veículos em Contagem – antes era usado por uma prefeitura do interior paulista –, o velho guerreiro praticamente renasceu. A carroceria de duralumínio, usual na época, chassi e motor foram completamente reconstruídos, como se o veículo tivesse retornado à linha de montagem. Cortes revela ter desembolsado cerca de R$ 162 mil (valor de um micro-ônibus Volare zero quilômetro) ao longo de 11 meses na empreitada. "E valeu a pena. Decidi refazer a história do meu pai nesse ônibus. Não era fácil realizar as viagens numa época em que praticamente todas as estradas do Vale do Jequitinhonha eram de terra. Levávamos até dias para chegar ao destino", conta.
Se por fora o Ciferal 1974 exala história por onde passa, chamando a atenção de muita gente, por dentro o veículo traz características comuns aos ônibus atuais. Equipado com ar-condicionado, geladeira, mesa de jogos e poltronas de veludo, o clássico foi configurado para ser usado em longos passeios com conforto, realidade bem diferente da época vivida por João Batista.
VVR EM BH
O cuidado e a admiração de Alexandre Cortes com o veículo, que tem até espaço próprio na transportadora de cargas do empresário no Anel Rodoviário, fizeram do Ciferal uma das grandes atrações da última Viver, Ver e Rever (VVR), exposição anual de pesados antigos em São Paulo. Agora, com o organizador da mostra, Antônio Kaio Castro, Cortes planeja trazer uma edição da feira em BH. "Para isso, precisamos de apoio de empresários do ramo e espaço", aponta. Com tantos caminhões e ônibus antigos em Minas Gerais (alguns até em operação), acervo é o que não falta.