Um estudo feito pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e o Boston Consulting Group (BCG) aponta que, em médio prazo, a adoção do etanol como política de descarbonização do setor automotivo brasileiro seria mais eficiente que um suposto cenário de forte eletrificação da frota.
De acordo com o estudo, enquanto o cenário de protagonismo do etanol para veículos leves alcançaria uma redução de quase 15% das emissões de CO2 no ano de 2035, a adoção de um modelo baseado na eletrificação levaria a uma redução de apenas 5% nesse mesmo período.
A principal explicação para isso é que os motores flex ainda serão maioria na frota brasileira em 2035, o que aumenta a importância dos biocombustíveis para reduzir emissões de CO2 nos próximos 15 anos, já que o Brasil já possui uma infraestrutura pronta, tanto na disponibilidade de veículos com essa tecnologia, quanto na produção de etanol.
Para ilustrar isso, o estudo aponta que, se o Brasil adotasse o caminho da eletrificação em massa, o mix de vendas de veículo leves em 2035 seria de 37% para carros flex, 12% para os híbridos, 26% para híbridos plug-in e 21% para os elétricos. Mesmo com esse esforço, as estimativas apontam que em 2035 a frota leve total circulante no Brasil seria 78% flex, 3% híbrida, 9% híbrida plug-in e 5% elétrica.
Já em um cenário classificado com inercial, onde a transformação seria no ritmo atual, sem uma organização geral dos setores envolvidos, os motores a combustão teriam elevada penetração nos próximos 15 anos e a eletrificação seria voltada a segmentos específicos. Assim, no ano de 2035, 67% do mix de veículos leves oferecidos no Brasil ainda seriam de carros flex, contra 5% dos híbridos, 18% dos híbridos plug-in e 7% dos elétricos.
Mesmo com a conclusão favorável aos biocombustíveis, ninguém nega a importância da eletrificação dos veículos. De acordo com Masao Ukon, sócio-sênior do BCG Brasil, a eletrificação é um caminho inevitável, mas precisamos de soluções complementares que tragam resultados mais rápidos.
INVESTIMENTOS Na estimativa do estudo, caso o Brasil adotasse o cenário de convergência global focado na eletrificação, seria necessário um investimento de R$ 14 bilhões em pontos de carregamento até 2035, além de um aumento de 7.252 Gwh na geração de energia, o que corresponde a 1,5% da produção atual.
Já o protagonismo dos biocombustíveis demandaria investimentos de R$ 50 bilhões para a produção adicional de etanol até 2035, que vai corresponder a mais 18 bilhões de litros e o aumento de até 2 milhões de hectares de área plantada (hoje existem cerca de 9 milhões de hectares plantados para atender à demanda).
Independente do contexto, o estudo aponta um aumento dos veículos leves eletrificados nos próximos anos, podendo variar entre 32% a 62% em 2035. Segundo a Anfavea, um volume dessa magnitude não poderá ser importado, já que geraria sérios prejuízos à balança comercial brasileira, além de ociosidade ainda maior da indústria local. Assim, a indústria precisará entrar em um novo ciclo de investimentos para se manter competitiva.
Na visão da associação dos fabricantes, com uma política industrial adequada e bem planejada, esse cenário poderá promover um novo ciclo de investimentos nos próximos 15 anos superior a R$ 150 bilhões. "Outros países já definiram suas metas de descarbonização, bem como os caminhos para se chegar a elas. O Brasil, em seu papel de um dos principais mercados para o setor de transporte no mundo, não pode mais perder tempo", acredita Luiz Carlos Moraes.
INEFICAZ A Anfavea criticou as políticas e incentivos atuais praticados no Brasil, que, além de não considerarem como parâmetro a emissão de gases de efeito estufa, não conversam entre si. Enquanto isso, Europa, Estados Unidos e China têm focos bem definidos para atingir seus objetivos.
"A indústria automotiva precisa saber como direcionar seus investimentos para as próximas gerações de veículos e para inserir o Brasil nas estratégias globais de motorização com foco total na descarbonização", declarou Luiz Carlos Moraes, presidente da associação.
INSPEÇÃO VEICULAR Outro ponto abordado pela Anfavea é que, mesmo num cenário de convergência global, com quase 2,5 milhões de veículos eletrificados vendidos por ano em 2035, sua contribuição para a redução de emissões de CO2 será bastante limitada. A entidade aponta como única saída a implantação de políticas de inspeção veicular e renovação de frota.
Ainda de acordo com o estudo feito pelo BTG, a paridade do Custo Total de Propriedade entre um veículo leve elétrico (utilizado para passeio) e um veículo flex vai variar de acordo com o segmento. Para modelos mais caros, como um SUV médio, a paridade pode se dar em 2029. Para um modelo médio, como o Toyota Corolla, a estimativa é que a paridade será atingida em 2031, enquanto um carro compacto só deverá ter o mesmo custo de propriedade em 2035.