Em 23 de março de 2003 surgiu o primeiro automóvel fabricado no Brasil cujo motor usava o sistema flexível (etanol e gasolina) de forma viável. Foi o Volkswagen Gol 1,6 litro, lançado simultaneamente à comemoração de 50 anos da empresa no Brasil com a presença de diretores mundiais do grupo alemão e do presidente da República. Alguns meses depois de completar uma década em produção, a Anfavea projeta que em meados deste ano 20 milhões de veículos popularmente chamados flex terão sido fabricados, marco muito relevante.
Nada menos de 92% dos automóveis e comerciais leves com motores de ciclo Otto vendidos em 2012 tinham motores flex, incluídos nacionais e importados. Ao acrescentar os de ciclo Diesel, a participação cai para 87%. Nenhum mercado no mundo apresenta esse cenário.
Na realidade, flexibilidade de abastecer o mesmo tanque com combustível de origem fóssil, de origem vegetal ou mistura dos dois remonta ao início do século passado, por volta de 1910. Ford T e alguns concorrentes podiam usar um ou outro combustível. Preço da gasolina caiu e a experiência, abandonada. Ainda nos EUA, voltou em 1991, com metanol em pequenas frotas. O primeiro carro flex de série já com etanol surgiu em 1996, um Ford Taurus.
No Brasil, depois da crise de escassez de etanol em 1989/90, a Bosch apresentou um Chevrolet Omega de 2 litros com a tecnologia flex, mas o sistema de reconhecimento de combustível era caro e lento. O projeto só avançou depois de quatro anos, ao se descobrir que a sonda lambda (sensor de oxigênio) servia bem para identificar e gerenciar o tipo de combustível. A Volkswagen decidiu apostar na tecnologia. Motores de 1 litro representavam quase 70% das vendas à época e, assim, a fábrica escolheu o de 1,6 l por precaução. Como a Bosch fornecia sistemas de injeção para os motores VW de menor cilindrada, a Magneti Marelli acabou por receber a primazia.
O apelo do motor flex diminuiu quando o preço dos dois combustíveis se aproximou. A opção pelo etanol caiu drasticamente depois de 2009 e o governo ainda bate cabeças sobre a estratégia futura de preços relativos e carga fiscal diferenciada. Sem isso, só o apelo ambiental atrairá poucos compradores. Por outro lado, as fábricas têm sido lentas na evolução técnica dos motores. A partida dos motores sem auxílio de gasolina em dias frios, por exemplo, só surgiu em produção seriada no ano passado, e em alguns modelos.
Graças ao novo regime automobilístico Inovar-Auto e seus objetivos de menor consumo de combustível haverá avanços até 2017. A meta compulsória é cortar o consumo médio da frota à venda de cada fabricante em 12,5% sobre 2012. A meta incentivada (até 2 pontos percentuais a menos de IPI) chega a quase 19%. Alcançar essa referência, equivalente à da Europa em 2015, obrigará a investir além dos motores.
Grande passo, a injeção direta de combustível em motores flex apresenta potencial de corte de consumo em até 10%. Com uso eventual de turbocompressor, o ganho será maior com etanol. Significa que mesmo que o combustível vegetal custe 75% (talvez até 80%) do preço da gasolina, ainda será viável sua escolha na hora de abastecer. Hoje, a referência é de 70%.